ERASMO SHALLKYTTON

O POETA É O SENHOR DE TODAS AS EXALTAÇÕES HUMANAS

Textos


Acordando o governador João Castelo

 

Em 1977, eu ingressei na Escola de Música da prefeitura municipal de Caxias, Estado do Maranhão, com a ideia de aprender música em metal. Com poucos meses, fui submetido à prova escrita sobre música, escala musical e ler partituras, onde tive aprovação com nota dez. Ao fazer a prova no instrumento musical trompete, fui reprovado por não ter embocadura para tocar o instrumento trompete. No entanto, o professor avaliador, indicou-me que fizesse o teste para o trombone Sibemol. Ao realizar o teste no referido metal obtive aprovação com referência exemplar.

 

Não demorou muito, um dos professores me entregou uma pasta com várias partituras de músicas referente a dobrados militares, tais como: Dobrado 220 Avante Camaradas, Dobrado Dois Corações, Dobrado Batista de Melo, Dobrado Os Quatro Tenentes, Dobrado Sargento Calhau. Todas as manhãs, eu me encontrava na sala ao lado dos trombonistas do Corpo da Banda Municipal Santa Cecília para realizar os ensaios de dobrados, valsas e músicas clássicas.

 

No ano de 1978, eu recebi uma pasta preta com músicas e dobrados: Sou Rebelde, da cantora Lílian, Amigo - Roberto Carlos, Jesus Cristo, Dobrado Saudade da Minha Terra, canção do Soldado ou Canção do Exército Brasileiro, Canção da Marinha – Cisne Branco dentre outras.

Após os ensaios, eu toquei uma música do The Jordans – Tema de Lara, e que chamou a atenção de um clarinetista, chamando o professor.

 

-Hei Professor, o Erasmo está tocando de ouvido uma música.

 

O professor mandou parar a melodia e me disse que a Escola de Música e nem a banda permitia que seus alunos tirassem música de ouvido sem fazer uso de partitura ou qualquer outro meio de notação musical.

 

Para alegrar a cidade de São Luis, Estado do Maranhão, em outubro de 1978, a banda Santa Cecília fora acordar em seu aniversário o governador João Castelo Ribeiro Gonçalves, na época. Oportunidade em que se apresentou ao músico um senhor, dizendo:

 

- Você é um grande trombonista da banda. Eu estou surpreso com isto. Se você não me conhece, eu sou o pai da Alcione Nazaré, a Marron. Meu primeiro metal foi um piston. Hoje estou aposentado da Polícia Militar do Maranhão como tenente e maestro João Carlos Dias Nazareth. Fiz muitos dobrados militares e outras canções.

 

-É um prazer conhecer o senhor. Um grande regente e pai da cantora Alcione. Eu termino o segundo grau o ano que vem, apesar que terminou meu contrato de menor aprendiz no Banco do Brasil S/A. Eu fiquei muito triste quando não fui mais trabalhar. Eu procurei o gerente e outras pessoas, nada puderam fazer por mim. Nem mesmo concurso havia no Banco. A situação para mim era muito ruim. Em casa, meu pai não quer poeta e nem músico, ele já falou para mim. Ele não sabe que estou aqui em São luís, apenas minha mãe. E para completar, a prefeitura só me paga a metade do salário mínimo por mês com atrasos e sem carteira assinada, o que não dá para suportar.

 

-Você é poeta da cidade de Gonçalves Dias. Isso é bom demais. Não chore, você tem um futuro pela frente, tão jovem, não deve chorar. Saiba que eu fui pescador de camarões e trabalhei na lavoura, passando por sérias privações. Um dia, você vai ser grande trombonista melhor que o Raul de Souza.

 

Em 1979, no mês de maio fui chamado pelo professor e supervisor da banda, o qual me inquiriu:

 

- Eu recebi uma denúncia de que às 22 horas, você andava em uma bicicleta monareta no bairro Refinaria tocando a música Dancin Day com o trombone. É verdade? E se você tropeça e cai em um buraco na rua. Como é que fica o trombone da prefeitura?

Calado e sem dizer nada a respeito do caso, apenas baixou a cabeça.

 

E no mês de dezembro de 1979, meu irmão mais velho manda me buscar para trabalhar e estudar no Rio de Janeiro. Tendo concluído o segundo grau, despeço-me dos amigos e vou até a Escola de Música, local onde se encontra a senhora Joana. E perquire:

 

-Dona Joana, a senhora pode me entregar o trombone? Eu vou tocar no assento da escola.

 

Ela responde:

 

-É claro. Acontece que são doze horas e eu preciso fechar a escola.

 

-Não vou tomar o seu tempo. É que eu preciso tocar no trombone.

 

A senhora Joana pegou o Trombone e me entregou. Momento em que olhei pela última vez o trombone e comecei a tocar a música Carinhoso do famoso Braguinha.

 

No final da música, a Senhora Joana indaga:

 

-Por que você está tocando esta música triste. Você está chorando?

 

Eu disse:

 

-Eu vou embora amanhã para o Rio de Janeiro. Vou sentir falta do trombone e da senhora também. Eu vou, mais eu volto. Eu preciso me formar em direito. E vou processar a prefeitura por não assinar a CTPS do meu pai e ainda pagar mensalmente a metade do salário mínimo por toda a sua vida como motorista.

 

Joana disse:

 

-Que Deus abençoe tudo o que você diz. Eu também só recebo metade do salário. Me diga como vai ficar suas poesias?

 

-Dona Joana, no Rio de Janeiro eu terei mais liberdade em escrever e não preciso dá para vizinhos guardar meus escritos. Se eu tivesse condições financeiras, eu compraria um trombone para mim.

 

ERASMO SHALLKYTTON
Enviado por ERASMO SHALLKYTTON em 21/06/2025
Alterado em 21/06/2025
Copyright © 2025. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.


Comentários

Site do Escritor criado por Recanto das Letras